Na rua, nos bares, onde anda você?

Por que não encontro uma mulher dessa no bar de qualquer esquina? Não que eu dispense a mulher com bunda empinada e decote aberto rebolando na minha frente, mas uma mulher que fica rebolando jamais conviveria diariamente em minha cama ou na minha cozinha. Os bares da Augusta andam sem graça. É um bando de londrinas frustradas convivendo com um bando de gays virgens. Por que uma mulher dessas não convive na nossa mesa de bar? Ela não vai ficar falando só de Beatles e Mutantes, só de róque de batom e Crepúsculo. Ela vai beber uma ypióca, tragar cervejas e rir com o próprio riso ridículo. É, a Augusta anda chata. Mas continuo andando com ela. Enquanto uma mulher dessa não me aparece, continuo a tentar suportar os hippies tocando Raul Seixas por troca de uma cachaça, os filósofos que lêem a orelha do livro e saem argumentando qualquer bobagem ou os "intelectuais" fazendo de Erasmo Carlos um símbolo cult só porque ele apreceu na MTV e fez um myspce. Aliás, que venham os hippies tocarem em minha mesa. Vou adorar quando ela pedir o violão emprestado pra tirar um som e claro, quando me humilhar na roda de amigos na casa do Diego.


Georgia on my mind...

Por Raquel Toledo


Por mais que soubesse que deveria, que aquele desejo a consumiria, não tinha coragem de agir. De realizar. O medo da frustração era tremendo.
Questionar a ação em si virou mais cotidiano do que a questão da arte, a finalidade tornou-se irrelevante. Então valia o receio, aquele pé atrás.
Ela sempre soube do desejo que guardava. A dança era flâmula em seu peito. Mas diante de tanta concorrência, dificuldades e, principalmente, diante de tanto brilho e fama em volta dos outros, como concorrer? Como dançar se há tantas bailarinas melhores? Certamente, no mais ousado giro, vou cair, afinal, como rodopiar diante de tantos olhos que irão comparar tudo e me qualificar como “boa, mas nem tanto”, ou “poderia ser melhor” e até mesmo “estudou tanto… e é só isso?”. Ou o pior: o silêncio. Uma cabeça balançando levemente e sorrindo amarelo, nenhuma crítica, nem um elogio de que se pudesse extrair veracidade. Solidão, reclusão.
Guardar as sapatinhas de cetim talvez seja a melhor opção. Enrolar suas longas fitas rosas e sedosas em volta daquele delicado e doloroso sapato. Sentir com as mãos aquela ponta de gesso que já feriu as pontas de seus dedos. Já a fez chorar, sangrar. Quando ela era ainda uma pequena bailarina, pensava ser impossível que sapatilhas tão rosas, que vestiam os pés das damas de Degas, com cetim tão rosa… como poderiam machucar alguém?

Mas machucam.

E são as dores de ser bailarina. E por todas essas dores ela já passou. Ficaram para trás e foram superadas. E, ao guardar suas sapatilhas, percebe que talvez a dor das pontas lhe faça bem hoje. Calça novamente os pés e se sente descalça, em casa. Em sua solitude, põe a Billie Holliday para cantar. E, na pontinha dos pés, passeia por seu pequeno apartamento na cidade grande, que já não parece tão grande diante da imensidão da voz, da dança, do sax, do piano jazz.
Distante de olhos, de espelhos, de tutus e frufrus, finalmente a bailarina é bailarina. Numa calça velha, camiseta um pouco rasgada, o cabelo preso de qualquer jeito, sem maquiagem. Sem precisar competir com São Paulo, ao contrario, de sua janela, dança para toda a cidade. A sós, na altura que sempre teve (na ponta dos pés), vira-se magistralmente, Georgia, on my mind, rodopios, saltos virtuosos no pequeno e vazio apartamento. A cidade, a seu jeito, sabe aplaudir, e o aplauso é o alimento do artista. Basta saber ouvir, devorar. Georgia on my mind...

infinito II

Continuando o pensar infinito sobre o infinito

"Para definir uma grandeza infinita, eu ponho um oito na horizontal e divido por um. Para definir o infinitamente pequeno, eu ponho o um e divido pelo mesmo oito na horizontal. Nada mostra o que queremos expressar. A grandeza infinita é o cosmos, e o infinitamente pequeno é a partícula do átomo. Eu posso definir o infinito sem entendê-lo. Quando não entendo o que defino, eu me aproximo do que chamam poesia. E então, a poesia se revela muito mais próxima da vida do que parece."

Complicado é ser simples!

Cão sem alma


Fausto fez um acordo e vendeu sua alma Mefisto em troca de prazer, juventude e poder. Vários rock stars são acusados de fazer o mesmo, pela fama e sucesso. Bom, alguns realmente devem ter feito um acordo com algum ser poderoso, pois é difícil entender como alcançaram o sucesso. Sei que vários estariam dispostos a vender sua alma para ter uma vida de prazer e orgias na terra, para que se preocupar com a eternidade se você não sabe se ela realmente existe?
Mas existem outros que dizem que as pessoas devem viver sua vida na terra, não procurar nenhum prazer que possa ser pecaminoso, levar uma vida totalmente voltada para o bem, fazer o bem para os outros mesmo que com isso ela sofra. Mas fazem isso pensando se um dia irão para o céu ou para o inferno; não é para o bem do próximo, é o medo da punição "divina". Não estão preocupadas com o futuro da humanidade, apenas estão interessados em seu cantinho no céu. Isso parece ser meio egoísta. Também deve ser complicado decidir a "eternidade" de alguém, por alguns anos vividos em uma terra injusta.
Tudo isso é muito complexo, mas eu não me preocupo com isso, quando era criança uma professora de religião me disse que quem não era batizado não tinha alma, era igual aos cães. Bom, por um lado não tenho o que negociar por uma vida de prazer sem fim, por outro lado também não preciso me preocupar em procurar prazer por minha própria conta. Já que não tenho alma, minha vida se acaba depois daqui... ou será surgirei novamente como um cão?

Acabou o nosso carnaval


Uma semana depois, o carnaval acabou. Uma boa estratégia dos advogados de Ezequiel Toledo de Lima. quem iria se lembrar de João Hélio no meio de tanta folia? Ironicamente, neste último sábado de carnaval, o Ministério Público resolveu pedir anulação do pedido de liberdade para o jovem delinquente. Porém, a partir da próxima segunda-feira é que o bloco da justiça brasileira vai mexer os quadris.
Uma semana depois, o carnaval acabou. Um dos maiores sambistas deste país não foi lembrado. Em seu centenário, Adoniran Barbosa não chegou a dar suspiros nas avenidas. O sambista paulista que era de uma corrente diferente da carioca, por tratar no samba o cotidiano, o trabalho e as cachaças. Lógico que essa corrente foi um termo inventado pelos imbecis intelectuais que rondavam o samba décadas atrás, pois Adoniran estava mais preocupado em cantar a dar bola a essa rixa bairrista. Se o povo conservador conseguiu algo, foi calar quem cantava a verdade. A globo acha mais bonito um samba enredo sobre o chocolate. Surpreso? Eu não.
Uma semana depois, o carnaval acabou. O mundo dos blogs andava muito parado. O que resistiram, trataram de julgar toda a folia. Não estavam satisfeitos por quatro dias de descanso. Corajosos foram os que assumiram adorar esta data pelo puro prazer de não fazer nada. Senão gosta de carnaval, saia da internet e procure o bar mais próximo ou aproveite para realmente fazer nada. Aposto que todo mundo estava precisando. Agora essa minoria vai voltar a falar do dia que teve com o namorado, o passeio com o cachorro e do trabalho infernal de faculdade.
Uma semana depois, o carnaval acabou. A polícia se esqueceu do seu carro, da sua carteira, de sua segurança. Mas fique tranquilo, os mijões passaram a noite no xadrex. E hoje, Arruda ficou uma hora a mais na cadeia, mas a outra Arruda foi mais lembrada por não conseguir terminar o desfile do centenário do Corinthians.

Desejo Real







Donos de bonecas de silicone estão satisfeitos. Explicam que a mulher de verdade pode até se subter a cirurgias plásticas e colocar seios de silicone, mas a mulher toda siliconada não fala, não trai, nunca pede nada, não se divorcia, não atormenta, não tem doenças venéreas, jamais engravida muito menos tem TPM. Você nunca terá sogra pois ela não tem mãe, não bebe, não fuma e, além de tudo foi feita sob medida para você! Desse jeito não há competição!

Qualquer homem perfeitamente muderno poderia ficar anos a fio com uma boneca. Será que uma mulher ficaria anos com um boneco? Geralmente é o contrário, as mulheres fazem o homem real de boneco. A mulher vai se virando como pode: coloca um siliconizinho ali, um sutiã ajustável aqui, uma unha postiça acolá. Ele sempre acredita. Ele adora ser enganado. E, para o homem muderno nem sempre interessa o que é real.


Se você ainda não sabe se deve comprar ou não, Veja aqui o documentário "Love Me, Love My Doll" sobre a vida de um proprietário e entusiasta das mulheres de silicone.

Caloura

Sexta-feira. Sete e quarenta e cinco da manhã e o despertador toca. Angélica acorda ofegante, quase como alguém que mal dormiu. Levanta-se rapidamente, ganha um beijo rápido do pai atrasado pelo corredor e encontra o rumo até o banheiro. Um banho rápido e muita empolgação.
Não deu nem tempo de deixar o banheiro todo embaçado com o vapor, coisa que ela mais gosta de fazer. Nossa menina se dirige ao quarto da mãe que dorme o sono dos justos. Angélica deita suavemente ao seu lado e pede gentilmente que a mãe se levante, pois não quer perder um minuto sequer daquele que é sempre o seu dia favorito do ano. Segunda-feira as aulas começam e chegou o dia de comprar material escolar. As duas se apressam e pegam o metrô rumo ao centro da cidade. Nem a lotação do vagão consegue tirar a empolgação da menina, afinal, em alguns minutos ela encontrará o seu mundo mágico. Chegam na estação. Cada passo até as lojas parecem filmados em slow motion, tamanha a emoção contida nos olhos angelicais.
Lá ela estava. Angélica e todas aquelas canetas coloridas, cadernos com cheiro de morango, jogos como inúmeros lápis de cor, borrachas em formato de coração, apontadores automáticos, mochila com o maior número de bolsos possíveis, adesivos, muitos adesivos! Esquadros, será que precisarei de esquadros? Ela guardava o grande momento sempre para o final. A hora de escolher o seu fiel companheiro para o ano todo. Onde todos os seus amigos assinariam no
final do ano e ela o guardaria com carinho numa caixa com todos os outros desde a sua infância. O estojo. Depois de muito pensar, escolheu um supercoloridoflorido estojo. A volta para casa era só suspiros e a sensação de que mais um ano se iniciaria. Estava ansiosa para ver todas as canetas, cadernos e afins dos seus novos companheiros. O final de semana demorou uma eternidade para passar. Angélica arrumou metodicamente cada caneta para o grande dia. Era como começar o primário novamente.
Segunda-feira. Seis e quinze da manhã e o despertador toca. Angélica acorda ofegante, quase como alguém que mal dormiu. Levanta-se rapidamente, dá um beijo nos pais que ainda dormem e encontra o rumo até o banheiro. Um banho longo com direito a todo vapor do mundo.
Roupas e tênis devidamente separados, mochila nas costas, um Toddynho na geladeira e uma Ana Maria no armário e cá está ela pronta para o seu primeiro dia de aula.
No ônibus, todos os pensamentos do mundo. Será que farei bons amigos? Será que os professores gostarão de mim? Será que comprei cadernos suficentes? O ônibus pára. Angélica adentra calmamente o ambiente com um caderno abraçado junto ao peito. Procura o seu nome na lista e caminha para a sala centro e trinta e um. Estranha o número de salas, no seu antigo colégio só existiam doze. Passa pela porta e senta-se exatamente no centro da sala, queria se sentir protegida e ter uma visão privilegiada da sala toda. Os alunos vão chegando aos poucos. De cabeças raspadas, chinelos e bermudas chegava o primeiro grupo. Ela estranho o fato de não terem cadernos. Um outro grupo, eles engravatados e elas de salto alto se encaminha para as mesas do fundo. Alguns carregam notebooks. Não há lousa nem mapas pela sala, apenas um projetor. Tudo parecia confuso para Angélica. Ela questiona se tinha errado o endereço ou o número da sala, mas resolve aguardar. Um outro garoto chega e Angélica se afeiçoa a ele, afinal, ele carregava um caderno e pediu gentilmente uma caneta para ela. Parecia que existia alguém com quem ela conversaria.
O professor chega. Sem pedir silêncio, sem diário para chamada, sem jaleco. Angélica tremia.
A faculdade pode parecer um lugar estranho para alguns.

A arte de enrolar


- Responde: você tem certeza de que é feliz comigo? Nunca entendo esse seu olhar divagante.


- Hum?...


- Perguntei se ainda é feliz comigo.


- Bem... digamos que... "a existência precede a essência" - Sartre!


- Muito bem, mas o que isto quer dizer? Dá pra ser objetiva?


- Isto quer dizer que "se você recorda a si próprio quando você é você, você não está com o propósito de criar você" - Gertrud Stein, saca?


- Não, não saco. Tá a fim de abrir a relação, é isso?


- "Sossegadamente fitemos um ao outro e aprendamos que a vida passa, e não estamos de mãos enlaçadas" - Ricardo Reis! Linda essa, não?


- Isto quer dizer que você soltou minha mão e vai me mandar à luta?


- Mas será que você não consegue captar a profundidade do que digo? Tem sempre que ser literal e levar tudo a ferro e fogo? Que coisa mais limitadora!


- Chega de me enrolar com essas citações! Não dá pra falar com as próprias palavras?


- Não adianta. Você não entende...


- Nem eu e nem você! Já estou farto desse seu gênero pseudo-intelectual barato e pouco prático de ser! Foi a fórmula que encontrou para fugir das decisões.


- "A potência intelectual de um homem se mede pela dose de humor que ele consegue ter" - Nietzsche! - Essa é boa, hein? E você não está tendo nenhum senso de humor agora.


- E a potência sexual não conta? Intelectualismo é coisa de bicha ! Esses manés todos que você citou aí deviam ter sérios problemas sexuais! Tudo um bando de veados!


- Conta, claro! Mas aí eu teria que recorrer a Darwin, e não me vem nada dele à cabeça agora.


- Dá prá ser mais clara? Tá a fim de me provocar, é? Pergunta simples: ficamos ou abrimos?


- Ai, quanta dicotomia, mon Dieu! Tudo é tão relativo...


- Já sei, já sei: Einstein. Desisto...


- Bem, esse relativo é relativo... Einstein não deve ter sido o primeiro a dizer isto mas...


- Chega! Vá pro inferno!


- "O inferno são os outros" - Sartre!



*Homens são tão primários, que horror!...

"Horror de sentir a alma sempre a pensar..." - Fernando Pessoa!